sexta-feira, 30 de julho de 2010

Crônica desta* semana

Um dia nos correios

Conflitos e desentendimentos estão sempre à espreita, prontos para pular sobre você. A ida aos correios para enviar o material de inscrição em um concurso cultural começou divertida, não havendo nada que mostrasse que eu poderia me chatear ali. O fato de a máquina de distribuição das senhas estar estragada era um indício de que as coisas poderiam se complicar, mas eu ignorei esse sinal, divertindo-me com o curioso diálogo entre uma mulher e o funcionário encarregado de organizar a fila de clientes.

– Depois dele, sou eu né?

– Não, a senhora é depois dele – disse o funcionário, apontando para um homem vestido com o inconfundível uniforme amarelo usado pelos carteiros.

– Mas ele é carteiro. Ele também vai ser atendido?

– Sim – respondeu sem conseguir conter o riso o organizador da fila. – Os carteiros também usam os correios.

Um carteiro na fila dos correios é realmente uma cena dessas que, apesar de não poderem ser chamadas de absurdas, te deixam meio confuso. Você espera que o carteiro esteja ali para trabalhar, não para enviar uma carta. Eu me solidarizei com a mulher e passei a me divertir sozinho imaginando frentistas vestidos com seus macacões parando para abastecer seus carros ou pessoas vestidas de garçons sentadas em mesas de restaurantes. Foi quando o problema aconteceu.

Para que vocês possam entender, preciso voltar a alguns minutos antes do divertido diálogo entre a mulher e o funcionário. A agência à qual fui possui duas fileiras de cadeiras, com cerca de seis lugares cada uma, para que aguardemos a nossa vez. Quando cheguei, vi dois rapazes sentados na fileira de trás. Tentei retirar minha senha e fui avisado por um deles que a maquininha não estava funcionando. Logo atrás de mim chegou um senhor, que também tentou em vão retirar sua senha e foi avisado pelo mesmo rapaz sobre o problema técnico.

Foi nesse momento que apareceu o funcionário. Perguntou se eu era o primeiro na ordem de chegada, mas, educadamente, disse que os dois jovens já estavam lá quando eu cheguei. O funcionário disse então que eles eram os primeiros, eu o segundo e...

– Não, o segundo sou eu – interveio, do canto do balcão de atendimento, um sujeito de óculos e cabelo comportado portando uma grande caixa de Sedex. – Eu cheguei depois deles dois – disse. Ninguém o questionou. O guardinha então pediu para que nos sentássemos todos na primeira fila de cadeiras e em ordem de atendimento. Os dois rapazes, o sujeito de óculos, eu e o senhor.

Todos obedecemos, menos o sujeito de óculos, que decidiu ir até um outro balcão para fazer não sei o quê, talvez procurar o CEP, ou terminar de preencher o endereço em seu pacote. O fato é que ficou um lugar vago entre mim e os dois rapazes, que logo foram atendidos, pois estavam juntos.

Chegaram então o carteiro e, depois, a mulher que estranhou o fato de ele estar na fila. Entretido com minhas fantasias sobre frentistas abastecendo seus carros e garçons indo jantar fora, ouvi a palavra “próximo” ser gritada por uma das atendentes. Completamente esquecido do sujeito de óculos que havia se ausentado da fila, levantei-me e fui até o balcão.

– Queria mandar esse material...

– Você tá furando fila! – disse um agora nervoso sujeito de óculos.

– Ah, me desculpe, eu achei que fosse minha vez – eu disse, ainda calmo.

– Não, você sabia que era a minha vez – bradou, o sujeito.

Pronto, eu tava puto. Mas que safado, filho de uma égua, me chamando de fura-fila assim na frente de todo mundo e não aceitando minhas explicações. Aí, acho que eu já tava falando meio exaltado. Tentei dizer que como havíamos feito uma fila e ele se retirou, acabei me distraindo e que havia me ENGANADO e não furado fila, mas ele não deixou eu terminar minha frase. Disse, nervosinho (eu tava puto, mas ele tava nervosinho), que ele havia avisado que era o segundo da fila. Filho da puta. Continuava sem me ouvir.

– O senhor não precisa ficar nervoso – eu disse, provavelmente muito irritado. Sim, eu sei, é difícil não ser meio patético quando entramos numa discussão dessas.

– O assunto já está resolvido, amigo – ele retrucou.

Foi a gota d’água. Larguei meus papéis e dei um soco na orelha esquerda do cara, fazendo seus óculos voarem e acertarem a testa da pobre atendente. Sem dar chances para ele reagir, torci seu braço para trás, como aprendi nas aulas de luta, e o fiz, contorcendo o rosto como um bebezinho prestes a chorar, ajoelhar-se. Camalmente, então, disse:

– Eu havia esquecido do senhor. Foi uma distração. Não foi má fé. O senhor entendeu? – perguntei enquanto dobrava um pouco mais seu braço, como meu professor me ensinou fazer. Gemendo, ele balançou a cabeça afirmativamente. O soltei, peguei meus papéis e fui a outra agência.

Quem me conhece sabe que o fim não foi assim. Mas estava entalado com esse negócio de ser chamado de furador de fila quando havia apenas me distraído, e gostei de imaginar essa cena. Na verdade, até entendo que o cara tenha achado que eu havia agido de má fé, pois muita gente age assim em filas. Mas juro que foi distração e queria que a conversa tivesse sido mais amigável. Tomara que seja da próxima vez.

*Ninguém garante que semana que vem haverá outra crônica

terça-feira, 13 de julho de 2010

Agora, as guitarras

Retomamos hoje as gravações do disco. O Ju concluiu duas músicas. Assim, a coisa fica bem encaminhada. Depois das guitarras, vão faltar só as vozes e umas coisinhas adicionais de violão e violoncelo. Também devemos usar trompetes em uma música e talvez alguns pianos pra deixar tudo mais bonito. Não vou aqui arriscar uma data pro lançamento porque cronograma de independente é essa coisa solta mesmo... ;-). Abaixo, o Ju testa o som de sua tele (e não strato como eu tinha dito e o Pedro me alertou). Na case, ao lado dele, a semiacústica Gibson gentilmente cedida por Fernando Brasil, parceiro de uma das músicas que estamos gravando. 

Abraços!

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Crônica desta* semana

Paul, o polvo; pajelanças e a expansão do Universo


Vocês provavelmente viram as notícias sobre o polvo vidente de um zoológico alemão. O bichinho que acertou quem ia ganhar os jogos que a seleção de seu país fez na Copa. Todo dia de partida, davam comida para Paul (é o nome do bicho) dentro de duas caixinhas, uma com a bandeira da Alemanha estampada e outra com as cores da nação adversária. O molusco espertalhão acertou todas. Abriu a caixinha com a bandeira de seu país nos dias de vitória e preferiu as dos adversários nos dias em que os germânicos acabaram derrotados.


Não sei vocês, mas eu acho isso incrível. Como é que pode o polvo sempre acertar? Eu confesso que sou fascinado por esses acontecimentos para os quais a única explicação lógica é uma baita coincidência. Mas coincidência de com força, sabe? Daquelas que fazem você exclamar: “Mas é muita coincidência, não pode ser!”

Sou tão fascinado por essas coisas que nunca me esqueci da notícia mais incrível que li até hoje. Não recordava muito bem o ano e o local, mas o Google me ajudou. Foi em 1998, em Roraima. O fogo consumia havia dias um pedação de floresta, e os bombeiros não conseguiam apagar as chamas. O tempo não ajudava, e o governo – acho que o federal mesmo – chamou dois pajés caiapós para fazerem uma pajelança chamando a chuva. Se não me engano, até ofereceram uma graninha se o trabalho desse resultados. Os dois foram lá, fizeram seus rituais e pronto. No dia seguinte choveu. Choveu! De verdade. Não é zoação. Não é muita coincidência? Tanta que acho que os pajés realmente devem ter sido responsáveis pela chuva.

Sou agnóstico. Não sei se acredito ou não em Deus, pelo simples fato de não ver motivos nem pra ter certeza de que ele existe nem pra ter certeza de que ele não existe. Mas tendo a acreditar que há mais coisas entre o céu e a terra do que blábláblá. E há duas coisas me fazem sempre voltar a pensar nessas coisas a mais que existem entre o céu e a terra: as baitas coincidências e o espaço sideral.

Uma lua cheia bem grande e amarela sobrevoando a cidade é o tipo de coisa que me faz continuar agnóstico e não aderir de vez ao ateísmo. Olho pra ela e me pergunto: “Como é que pode?” Nessa, não consigo descartar a possibilidade de Deus existir. Agora, li recentemente outra notícia intrigante. Cientistas estão construindo um telescópio pra estudar a tal da energia escura. É o seguinte: até uns 10 anos atrás, os físicos diziam que o Universo foi criado com uma explosão e passou a se expandir. Mas, como há muita matéria no Universo, logo há muita gravidade, que, obviamente, deve frear essa expansão. Eis que, então, eles descobrem que não, que o Universo está se expandindo cada vez mais rápido. Espantados, alguns chegaram à conclusão de que isso só pode ser possível se houver uma forma de energia desconhecida dando uma forcinha pro Universo. Seria a tal da energia escura. Não é bizarro? O Universo se expandindo cada vez mais rápido, up up and away? Como é que pode?

* Nada garante que na próxima semana haverá outra crônica

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Pílulas: pequenos fatos dignos de nota

Um colega de trabalho descobriu dia desses que eu cantava e que 'O tempo contra nós', que ele ouviu tantas vezes na Cultura FM, é minha. "Sempre achei que a música tinha algo de ingenuidade e de inteligência ao mesmo tempo", descreveu. Achei massa o comentário.

Crônica desta* semana



Retões e horizonte

Não há motivos pra se apressar no trânsito de Brasília. Costurar perigosamente, dar farol alto pra que saiam da frente, colar na traseira do alheio, tudo bobagem. Em Brasília é uma delícia guiar. Retões e horizonte. E tudo perto. Se está atrasado, relaxe. Serão só mais cinco minutos de atraso por causa do trânsito lento, vai por mim. Vivo atrasado, já fiz vários testes.

Desacelero meu 1.0 e me entrego a divagações que seriam um perigo em outras capitais, mas não aqui, no Eixão, no Monumental, na Epia. Nenhuma curva fechada adiante que exija minha total concentração. Por isso, gosto de lembrar das coisas legais que já vivi aqui. E esse troço dos espaços serem abertos ajuda pacas. Do Eixão Sul, indo pra Rodoviária, consigo enxergar a 209. Foi pro Giraffa´s de lá que fui com a Carol na noite em que a conheci. Nosso primeiro programa. Dividimos uma batatinha frita e duas cocas zero depois de um show meu em que quase ninguém foi. Mas ela foi, e só precisava dela mesmo. Minha vida ficou melhor naquela noite, no Gate's, na 402.

Às vezes saio do CCBB ou da Academia de Tênis (se bem que com o cinema fechado faço isso menos) e pego o Setor de Clubes Norte. Minha época de UnB, os tempos em que fazia natação na Apcef. A L2 é da 415 Norte, onde morava minha primeira namorada. Como eu era moleque e tolo. Vejo o Olhos d’Água. Lembro do dia em que fui parado por uma moradora da quadra, pedindo pra que eu aderisse a um abaixo-assinado pra transformar o matão abandonado em parque. Assinei, metido a hippie que eu era. Obrigado, gentil cidadã. O parque que você sugeriu e me fez apoiar ficou lindo.

Qualquer caminho traz lembranças. Até a Ponte JK já tem histórias. Foi por ela que passei pra acompanhar o Senhor F nas Escolas em São Sebastião. No centro de ensino de lá, uma surpresa bacana: banda Orgasmo tocando música autoral. A W3 lembra minha primeira infância, na 711 Norte. Época boa em que gangue era a Galera da 12. A gente tinha muito medo, mas eles não matavam, só roubavam nossos tacos de bete. O começo do Eixinho Norte traz de volta as idas de ônibus até o Conjunto Nacional pra comprar vinis na 2001, que fechou em 2008, e os primeiros VHS alugados na Privê da 102. Como vibrei quando achei na prateleira Comando Delta, com Chuck Norris!

Vou lembrando e, quando vi, cheguei. Aí, sim, é hora de ficar meio chateado. Achar estacionamento tá difícil. Mas dá pra parar um pouquinho mais longe e ir andando. Nada muito grave.


* Nada garante que semana que vem haverá outra crônica.