Desde que descobri isso, sempre digito “beto só” lá e vou à caça de alguma referência a minha pessoa. Pois dia desses, vi uma menção a mim na comunidade do colégio Alvorada, no qual estudei todo o ensino fundamental, de 1ª a 8ª série. Não, querido leitor, não se tratava de nenhuma garota dizendo que ainda pensava em mim de vez em quando, nem de um antigo amigo buscando contato porque sentia minha falta. A mensagem era uma confissão de ódio, dita por um anônimo.
O tópico se chama “Confraria do porradobol”. Referia-se a uma espécie de rollerbol infanto-juvenil que os garotos da escola costumavam praticar. Todos entravam na quadra de esportes com uma bola de futebol e tentavam acertá-la, com fortes chutes, algum outro garoto. O jogador que tivesse o azar de ser atingido pela bola era surrado, com tapas, até conseguir encostar no pique, na maioria das vezes uma das traves de futebol.
Para muitos, imagino, a diversão estava no prazer de espancar alguém sem ser repreendido por isso, coisa que, confesso, nunca me agradou muito, e não estou aqui fazendo tipo. Para mim, o legal era a sensação de perigo. Eu sentia um frio na barriga semelhante ao de encarar uma montanha russa. Eu era um jogador cauteloso. Me esmerava mais em evitar a bola do que tentar chutá-la para atingir alguém. Ficava ali, atento, me colocando de forma a não ser atingido, escapando da bolada. Achava excitante.
Pois ao encontrar o tópico sobre porradobol no Orkut, descobri que o risco que eu corria era muito maior do que minha percepção infantil alcançava. Pelo que pude notar, eu era um alvo perseguido por alguns garotos. Vejam o que diz o anônimo em questão:
"Muito 10. Porradobol, demais. Estudei 82/90 e o porradobol eu lembro de 1982, 3ª série, no alvoradinha da 905/906 norte. Na hora do recreio. Eu lembro que tinha um CDF BETO (que hoje em dia faz parte de uma banda de rock Beto só e os solitários) e a galera era doida para acertar a bola nele bem longe do pique”.
Olha, devo confessar que não é muito legal ler algo desse tipo sobre mim. Mesmo que se refira a uma época em que eu tinha nove anos de idade. Mas depois de alguns segundos concluí que não estava de todo surpreso. Eu sempre soube, mesmo quando era criança, que muitos não gostavam de mim. A escola era um lugar um tanto ameaçador e sempre tinha uns marmanjinhos mais crescidos que gostavam de perseguir caras como eu.
É claro que eu era criança e a atenção de Suzana era um transtorno. Eu ainda não pensava em meninas, queria ficar com meus amigos. Passei a fugir de Suzana como a gatinha foge de Pepe, lê gambá no desenho animado. Mas certamente isso devia irritar os outros garotos do fundo da sala. Tanto que um dia eles conseguiram me cercar e me atingir como não conseguiam no porradobol. Combinaram de ligar para minha casa, na hora do Jornal Nacional, um depois do outro, me questionando sobre por que eu não namorava Suzana. Recebi acho que quatro ligações na seqüência, todas constrangedoras. Perguntavam se eu não gostava de mulher. Eram cruéis. Mas tudo bem, eram crianças e se sentiam menores que eu... Fazer o quê?
Mas me saí bem, conversei com uma maturidade que eu mesmo não sabia que tinha. A um deles, perguntei: “Você namoraria alguém se não gostasse dela?”. “Não” foi a resposta e o papo acabou. Descobri naquela noite que era muito observado, mas não imaginava que gerava antipatia a ponto de ser um alvo no porradobol. Ainda bem que fui um jogador cauteloso e nunca precisei correr até o pique debaixo de tapas. Vocês não me pegaram, bobões. O CDF se deu bem.