Tem dias que você tá buscando o que escrever e ‘tóin’: dá de cara com um texto que já fala o que você queria. Aconteceu de novo comigo dia desses, lendo a edição deste mês da Bravo!. Lá tem o texto ‘Garrafas ao mar’, do redator-chefe da revista, João Gabriel de Lima. Ao falar da sua geração de escritores, ele aponta: “Até gostamos quando a palavra ‘escritor’ aparece primeiro no pé biográfico de algum de nossos artigos. Mas, descontadas as exceções, somos, humildemente ou orgulhosamente, exatamente isso: jornalistas e publicitários – e médicos, psicanalistas, professores, diplomatas, ferreiros, carpinteiros – que também escrevem”.
Mais adiante, ele afirma: “O fato reflete um espírito de época. Somos romancistas céticos em relação à importância do romance para a cultura brasileira. Qual a nossa ‘missão’ na sociedade? Provavelmente nenhuma – e ainda bem! Agora temos a liberdade de escrevermos sobre o que quisermos. Temos a consciência de que nossos romances não irão mudar o mundo. Escrevemos sobre nossas paixões e já não sabemos para quem escrevemos. Nossos romances são como garrafas jogadas ao mar, que podem atingir grupos pequenos ou grupos grandes. Não sabemos para quem escrevemos e, para nós, o maior prazer é justamente este: encontrar leitores que não sabíamos que existiam”.
Pois nenhum texto sobre a cena independente no país que eu tenha lido nos últimos anos fez com que eu me identificasse tanto quanto me identifiquei com esse texto. Substitua “escritores” por “músicos”, “livros” por “canções” e “discos”, “leitores” por “ouvintes”, que você terá uma bela descrição de como me sinto fazendo música.
Não é por acaso que meu primeiro disco, lançado em 2005, se chamava ‘Lançando Sinais’. Na capa, a bela ilustração de um farol feita por Mário Baratta. O título era um manifesto da condição de músico independente, que lança suas canções para um público que ele não sabe se realmente existe, mas pressente que está lá, pronto para se identificar com suas canções.
No meu caso, sei que o grupo que atinjo não é grande. É pequeno. Isso quando comparo até mesmo com outras bandas independentes, como eu. Mas acho que poucos artistas são tão felizes como eu com relação a isso. Uma pessoa que me escute e diga – “Ei, Beto, eu adoro aquela sua música” – já justifica toda minha produção. E digo mais: mesmo que eu não tenha como demonstrar isso, tenho certeza de que meu público reúne, proporcionalmente, mais pessoas legais que qualquer outro. Às vezes sinto, fortemente, que eu poderia amar cada um dos meus ouvintes. Tenho fé de que são pessoas amáveis, como eu tento ser.
Qualidade. Meu público tem qualidade. Arrogante? Ah, não sei. Talvez seja só excesso de auto-estima, vai. Às vezes sofro desse excesso... e como é bom! Claro que existe muito mais gente por aí que ainda precisa ouvir minha música. Gente que tenho certeza de que irá gostar. Por isso, sigo meu caminho, mantenho esse blog, termino meu segundo disquinho (que, aliás, tá ficando bem bonito e mês que vem vocês poderão ouvir três músicas dele). Mais canções ao mar pra chegar aos ouvidos de pessoas bonitas e do bem.
Se eu digo que elas “precisam” escutar, não é no sentido de que minha música é fundamental ou coisa assim. Como diz João Gabriel no seu texto, não temos mais uma missão na sociedade. Temos apenas paixões para dividir. E dividir paixões, quando se trata de paixões expressas pela arte, é uma delícia. Um beijo carinhoso para quem me ouve (ou pra quem me lê!). :-)
PS: A edição da Bravo! em questão traz uma notinha sobre o disco do Superguidis. Falam bem!