Recentemente, me deparei com duas sugestões direcionadas aos jovens artistas e que divido com vocês. A primeira é do escritor e diretor de teatro Fernando Bonassi (foto), que recentemente estreou em São Paulo a peça 'O Incrível menino da fotografia'. Em um programa da Globo News, ele afirmou que a única saída hoje para o artista é causar incômodo no público.
A frase foi dita dentro de uma reflexão sobre a função da arte nesses dias atuais, em que artistas e sociedade parecem anestesiados, sem saber o que pode ser feito para mudar o atual estado das coisas. Bonassi disse que quando alguns mais aflitos (e vira e mexe eu sou um desses aflitos) lhe questionam sobre o que devem fazer, ele sugere: "não façam". Não façam o que estão todos fazendo, não sigam o fluxo dos acomodados. Parem e se recusem a ir com os outros.
Dessa forma, Bonassi nos convida a lançarmos um olhar desconfiado à essa normalidade instalada que nos faz levar a vida assim, meio sem gosto e rumo ao caos - caos ambiental, intelecutal, cultural, social... Dentro desse contexto, ao artista resta, portanto, não levantar bandeiras ou indicar o caminho certo (como era possível e imperativo na década de 60), mas causar o desconforto que leva ao questionamento e nos ajuda a despertar da letargia. Ao defender essa postura, Bonassi parece aproximar o papel do artista ao do intelectual, que segundo o geógrafo Nilton Santos era o de "mostrar que as coisas podem ser diferentes".
A outra dica veio de um dos meus mestres, meu professor e hoje - com muito orgulho - colega Severino Francisco. Em um artigo que escreveu para o jornal da faculdade onde dá aulas, Francisco diz:
"Em um país invadido e submetido pela cultura estrangeira, como é o caso do Brasil, restam [ao artista] seis alternativas: 1) escrever uma carta em tupi-guarani reclamando para o presidente da República, como faz o personagem Policarpo Quaresma, de Lima Barreto; 2) entronizar a cafonice e proclamar "sou brega, mas sou feliz", como fizeram Xuxa, Hebe Camargo e as duplas sertanejas; 3) compor e cantar em inglês, como optaram alguns grupos de rock; 4) adotar um universalismo abstrato e ignorar qualquer circunstância local, regional ou nacional; 5) imitar a última novidade de Nova York, Paris ou Londres e fazer uma vanguarda requentada, de terceira mão; 6) assumir a condição brasileira terceiro mundista, com toda a sua potência e contradições, de uma maneira crítica e criadora, sem se fechar aos influxos da cultura internacional".
Mais adiante, ele continua:
"Embora esteja em baixa na pasmaceira pós-moderna conformista na qual estamos mergulhados, esta última me parece a atitude mais fértil se examinarmos a história da cultura brasileira."
Arrisco dizer, que em termos de música pop, estão no meio independente aqueles que têm potencial para seguir esse caminho, a começar pela teimosia de sobreviver à margem do pastiche de sonho americano vendido pelas majors, que entopem, às custas de jabá, a programação das rádios com lixo cultural. Minha pretensão me faz querer ir além da sobrevivência no mundo independente, produzindo arte incômoda e brasileira (que não precisa, como diz meu amigo Cláudio Bull, ter necessariamente elementos nordestinos ou regionalizados). Espero que eu consiga. Se não neste próximo disco, nos outros que virão - por teimosia e prazer.